Tragédia em Santa Maria

Como vivem famílias de vítimas da Kiss 11 meses depois da tragédia

Marilice Daronco

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Fim de ano. Famílias reunidas. Seja com a casa cheia ou só com os mais chegados, esta é uma época repleta de emotividade. Em um ano marcado pela tragédia da boate Kiss, que completa 11 meses hoje, é difícil que o assunto fique fora das conversas entre os familiares e amigos das vítimas e dos sobreviventes do incêndio. É mais difícil ainda que as emoções não venham à tona. Foi o primeiro Natal sem a companhia do ente querido, será a primeira virada de ano sem poder desejar-lhe o que todos buscam: felicidade. Por mais que se queira levantar e reconstruir _ a cidade inclusive _, as cicatrizes da morte de 242 pessoas doem, principalmente, nas famílias envolvidas na tragédia.

Geralmente, quando se fala em luto, as pessoas tendem a imaginar uma situação que se aplicaria a qualquer um: dor, lamento, sofrimento, aperto no peito, vontade de ficar isolado do mundo. Mas o luto tem tonalidades diferentes para cada um, é um processo individualizado, como descrevem os estudiosos da área. É por isso que, mesmo tendo passado pela mesma experiência coletiva de perda, o comportamento das pessoas e a evolução do seu luto pode estar em momentos diferentes neste fim de ano.
_ As famílias estão passando por momentos muito distintos. Há desde aquelas que já estão reorganizando suas vidas, voltando ao trabalho e investindo em outras atividades, como o voluntariado. E há as que ainda negam essa perda e não conseguiram retomar atividade alguma _ comenta a mestre e especialista em psicologia clínica Maria Luiza Leal Pacheco.

Maria Luiza começou a trabalhar com os sobreviventes da tragédia e seus familiares ainda em janeiro, como voluntária. Em março, fez a seleção pública para integrar a equipe de atenção psicossocial do Programa Acolhe Saúde, que faz esse tipo de atendimento e, desde então, é um dos profissionais que trabalham diretamente com as famílias das vítimas.

Em média, de cem a 145 pessoas buscam atendimento no Acolhe Saúde por mês.
Elas têm consultas com psicólogos, médicos, apoio do serviço social e atendimento de enfermagem.
_ Alguns pais e mães de vítimas que nunca tinham vindo antes, agora têm procurado pelo serviço. O mesmo tem ocorrido em relação a alguns sobreviventes. Cada um tem o seu tempo de elaborar o luto. Um dos primeiros passos é interiorizar que a pessoa faleceu mesmo, e o tempo que demora para que cada um consiga isso é diferente de uma pessoa para outra _ conta Maria Luiza.

A psicóloga comenta que, nesta época do ano, quando as pessoas costumam ficar mais sensíveis, muitas dessas emoções tendem a vir à tona.
_ Temos de lembrar que, até o dia 27 de janeiro, as famílias estão vivendo as primeiras datas sem os seus entes queridos. Foi o primeiro aniversário, o primeiro Dia dos Pais e Dia das Mães, o primeiro Natal, o primeiro fim de ano. Isso, em geral, mexe muito com as pessoas, e cada uma tem uma forma de reagir a isso _ diz a psicóloga.

Especialista diz que focar na perda deixa mais difícil seguir em frente

Nas diferentes formas de tentar seguir em frente, questões que antes eram banais podem passar a ser verdadeiros dilemas diante da dor da perda. É bom reunir a família? É saudável manter o quarto do ente querido intacto em casa? É melhor falar ou calar? E até mesmo: será permitido sorrir?

_ São questões cheias de sutilezas. Uma paciente contou, por exemplo, que um dia estava em uma roda de conversas quando deu uma gargalhada. Naquele momento, ela percebeu que foi a sua primeira risada desde a tragédia e se sentiu culpada por ter aquele momento de felicidade. É preciso trabalhar todas essas emoções. Mostrar que essa risada não é uma falta de respeito. Porque se a pessoa se focar apenas na perda, vai ser muito mais difícil que consiga seguir em frente _ diz Maria Luiza.

A psicóloga ajudou a responder a algumas questões que podem  esclarecer dúvidas surgidas ao longo destes 11 meses. Mas não há respostas prontas. A única certe"

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